MANAUS (AM) – Crimes de feminicídio são constantes em Manaus, infelizmente, tendo o “Caso Débora” um dos mais recentes e de repercussão nacional. Grávida de 8 meses, Débora da Silva Alves, de 18 anos, foi asfixiada, queimada, teve os pés cortados, foi colocada em um tonel e ainda teve a barriga aberta para que o filho fosse retirado e jogado no rio. Essa, no entanto, não é a primeira vez que a cidade registra o caso de um assassinato de uma mulher grávida, por causa da negação da paternidade, assim como não é o primeiro onde uma gestante teve brutalmente o útero cortado.
O principal suspeito do crime de Débora, Gil Romero Machado Batista, de 41 anos, acabou confessando à polícia que causou a morte da jovem, que só queria ter a paternidade do filho reconhecida e ajuda financeira. O vigilante já era casado, dizia que o reconhecimento atrapalharia o casamento e acreditava que qualquer outro homem poderia ser o pai. A vítima só se relacionava com ele.
Segundo a delegada da Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS), Déborah Barreiros, o homem chegou a dizer que a grávida “já estava demais”, querendo muito, e que ele a atraiu até o local de sua morte para falar do assunto. “Ainda dentro de um carro Honda Civic, eles iniciaram uma discussão, pelo fato dela estar exigindo utensílios para sua gravidez, bem como para seu bebê, motivo pelo qual ele a agrediu fisicamente e a deixou desacordada”, disse a delegada.
Depois disso, o caso teve o pior desfecho, com a vítima sendo asfixiada com uma corda, levando “pisão”, sendo queimada e colocada dentro de um tonel. A barriga foi cortada com uma faca de pão e o bebê colocado num saco e jogado no meio do rio. Ainda não há informações dos restos mortais de Arthur Vinicius e a polícia vê poucas chances de encontrar.
Jogada em igarapé
Pelo mesmo motivo, uma gravidez indesejada por parte do pai, Miryan Moraes, de 21 anos, foi encontrada morta no dia 20 de janeiro de 2020. Ela estava com quatro meses, levou nove facadas e foi jogada em um igarapé no bairro Tancredo Neves, Zona Leste de Manaus.
Roberto Marinho Brito, de 29 anos, foi preso no dia 17 de outubro do ano passado. Ele cometeu o crime com a esposa dele, Adrya Polyane Aragão dos Santos, de 28 anos, que também foi presa pelo crime.
As investigações da DEHS apontaram que além de não aceitar a paternidade, o homem queria que Miryan abortasse, mas ela se negou. O mesmo aconteceu com Débora, que teria tomado remédios abortivos sem saber, oferecidos por Gil Romero, pelas mesmas razões. Ela achava que seria uma medicação para dores e por conta disso chegou a ficar hospitalizada, mas ficou tudo bem com o bebê.
Também semelhante, no caso de Miryan a esposa sabia que ela era amante do marido. Segundo a polícia, Adrya Polyane não cometeu o crime, mas estava no local, dentro do carro, enquanto o homem matava a vítima. Ana Júlia Ribeiro, esposa de Gil e que sabia do caso extraconjugal do marido, teria descoberto do crime só após o aparecimento do corpo de Débora, mas ajudou o marido a se esconder.
Em ambos os casos, os casais fugiram. Adrya e Roberto Marinho foram presos em comunidade rural em Maués (a 276 quilômetros de Manaus). Ana Júlia se entregou nesta quinta-feira (10) em Manaus e Gil foi preso no interior do Pará.
Quando Adrya foi presa, a surpresa: estava grávida. Ela e o marido iriam responder pelo crime de feminicídio e demonstraram assim como no primeiro caso, o desprezo pela vida do próximo e, sobretudo, por uma criança que estava prestes a vir ao mundo.
Barriga cortada
A notícia de que Débora teve a barriga cortada, mesmo morta, pegou a todos surpresos nesta quinta-feira (10). Em 2013, a doméstica Dayana Pires dos Santos, de 22 anos, foi condenada a 13 anos e quatro meses de prisão em regime fechado por ser acusada de cortar a barriga de uma grávida de 9 meses.
O caso foi também chocante, mas com outro desfecho, pois mãe e filho sobreviveram. Foi por causa de uma vizinha, que ouviu os gritos e choro do bebê, que o crime foi descoberto e a polícia acionada. O “parto forçado” foi realizado na avenida Solimões Parque Mauá, Distrito Industrial, Zona Sul da capital.
Na época, Dayana teria perdido um filho e queria uma criança. Ela conheceu a vítima num posto de saúde no bairro Mauazinho, Zona Leste, e perguntou se a mulher queria as roupinhas que ela tinha. A doação, no entanto, era uma emboscada.
Na casa de Dayana, a grávida foi atacada com uma pancada na cabeça. Ela estava com um filho pequeno que viu tudo. No tempo em que a vítima ficou desacordada, Dayana pegou uma lâmina de barbear e abriu a barriga da mulher. O bebê foi retirado e Dayana chegou a cobrir a vítima com um papelão na esperança que morresse.
O corpo seria enterrado em um buraco, no quintal, mas logo a polícia foi acionada por causa dos gritos. A vítima sofreu intenso sangramento, ficou com as vísceras expostas, em estado de choque, mas sobreviveu junto com o filho. Eles foram socorridos na Maternidade Ana Braga, na Zona Leste da capital, mas a grávida chegou a ficar internada em Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Na época do julgamento, Dayana disse que “ouviu a voz do além” para cometer o crime. O delegado Adriano Félix, que presidiu o caso, contou que apesar da mulher dizer que havia perdido o bebê, ela nunca esteve grávida e a partir disso passou a ter distúrbios psicológicos.
No entanto, exames de insanidade mental atestaram que a autora não tinha problema mental nenhum. Ela foi presa, condenada e baixou para a cadeia. O promotor do caso, Rogério Marques, chegou a dizer na denúncia que ela agiu com dissimulação, enganando a vítima.
Além destes, há outros casos de grávidas assassinadas em Manaus por diversos motivos. Em todos, não há a importância pela vida do feto, muito menos pela da mãe. Nos exemplos de Débora e Miryan, é possível ainda observar o desprezo dos homens, enraizado no machismo, considerando as vítimas como descartáveis, tudo para prevalecer as próprias decisões.
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