São Paulo – Condenado por crime eleitoral em segunda instância ao pagamento de multa de R$ 80 mil, o vice-presidente da República Michel Temer (PMDB), mesmo podendo ser enquadrado na Lei da Ficha Limpa, pode assumir a Presidência da República em caso de eventual afastamento de Dilma Rousseff e, assim, se tornar o primeiro presidente “ficha-suja” do Brasil.
Segundo o promotor autor da ação contra Temer, José Carlos Bonilha, da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, como a Constituição prevê dentre as atribuições do vice-presidente a possibilidade de assumir a Presidência em caso de afastamento do titular, a condenação eleitoral do peemedebista não o impede de exercer a função de chefe maior da República.
“A condenação (do TRE-SP) significa que Temer perde a capacidade eleitoral passiva, de se candidatar nas próximas eleições”, explica o promotor. “Em havendo o eventual afastamento de Dilma não haverá uma nova diplomação, não há novo ato constitutivo, pois uma das competências do vice é assumir em caso de afastamento do presidente”, segue Bonilha. “Um fato superveniente à diplomação não pode impedi-lo (Temer) de assumir a Presidência”, conclui.
Para ele, mesmo que a sentença do Tribunal Regional Eleitoral da última terça-feira, 3, não cite expressamente a Lei da Ficha Limpa, o vice-presidente já pode ser enquadrado na legislação criada a partir de um projeto de Lei de iniciativa popular para moralizar a política brasileira. Isso porque, segundo explica o promotor, a Ficha Limpa prevê que a condenação em segunda instância já faz com que automaticamente que o réu fique inelegível.
Na época em que a proposta popular de criação da Lei da Ficha Limpa foi encaminhada ao Congresso, em 2009, Temer era o presidente da Câmara e recebeu o 1,3 milhão de assinaturas pela criação do projeto.
Ainda segundo o promotor, mesmo que o vice pague a multa a que foi condenado pela Justiça Eleitoral, o Ministério Público pode recorrer para enquadrá-lo como “ficha-suja”, levando em conta a condenação em segunda instância. O entendimento é o mesmo do ex-juiz eleitoral Marlón Reis, um dos redatores da Lei da Ficha Limpa, para quem o pagamento da multa não livra o vice-presidente de ficar inelegível por oito anos.
Segundo Reis, Temer só terá poderá concorrer em eleições se o TSE revogar a decisão ou se forem transcorridos os oito anos estabelecidos pela lei da Ficha Limpa. “A lei é clara em estabelecer que a inelegibilidade decorre da condenação e nada tem a ver com o pagamento da multa”, disse.
Histórico
A ação contra o peemedebista por doações acima do limite legal nas eleições de 2014 foi proposta no ano passado. Temer foi condenado em primeira instância a pagar uma multa de R$ 80 mil, equivalente a cinco vezes o valor excedente doado por ele. Pela legislação, as doações eleitorais de pessoas físicas devem se limitar a 10% da renda do doador declarada no ano anterior.
De acordo com o TRE-SP, Temer declarou rendimento de R$ 839 924,46 em 2013, e doou R$ 100.000,00 na campanha de 2014. O valor representa 11,9% do que declarou o vice. Ao juiz de primeira instância, o peemedebista reconheceu que excedeu o valor permitido em suas doações. Ele acabou sendo condenado, mas não recorreu da decisão.
O Ministério Público Eleitoral, por sua vez, recorreu ao Tribunal Regional Eleitoral para que a multa fosse ampliada, o que foi negado por unanimidade pela Corte Eleitoral, que manteve a condenação, na terça. Ainda cabe recurso ao Tribunal Superior Eleitoral.
Em nota divulgada na quarta, 4, a assessoria do vice-presidente negou a informação do Ministério Público Eleitoral de que, condenado em segunda instância, o peemedebista se torna automaticamente inelegível.
“Ressalte-se que, em nenhum momento, foi declarada pelo TRE a inelegibilidade do vice-presidente. Não houve manifestação neste sentido. E só a Justiça pode declarar alguém inelegível. Qualquer manifestação neste sentido é especulação e precipitação”, diz a nota emitida pela Vice-Presidência.
A nota explica que Temer admite que fez, na eleição de 2014, por “erro”, doações que ultrapassaram em R$ 16 mil o limite permitido em lei. “Ele reconheceu essa situação em primeira instância e concordou em pagar multa de cinco vezes o valor do excedente doado”, diz a nota.
Procurada nesta quinta-feira, 5, e questionada sobre a possibilidade de Temer vir a se tornar o primeiro presidente “ficha-suja”, a assessoria do peemedebista informou que ele não iria comentar novamente o assunto.
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