Brasília – O procurador da República Ivan Cláudio Marx, que investiga as alegações do empresário Joesley Batista de que os ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT) receberam US$ 150 milhões em propina em contas no
exterior disse que a versão contada por Batista sobre as supostas contas é “incomprovável”. “A história dele é incomprovável. Pedimos documentos para comprovar, e não veio nada”, afirmou.
Procurada, a defesa de Joesley negou que o empresário tenha mentido e afirmou
que os delatores continuam à disposição da Justiça. A PGR (Procuradoria-Geral da
República) disse que, se ficar comprovado que Joesley mentiu em seus
depoimentos, o acordo de colaboração pode ser “revisto”.
Joesley Batista foi um dos executivos da JBS que firmou acordo de delação com a
PGR. Os delatores revelaram um esquema de pagamento de propina e repasses de
recursos via caixa dois a políticos de diversos partidos.
Em troca das informações, os executivos ganharam imunidade penal e não podem
ser processados pelos crimes que revelaram. A lei de delações premiadas, no
entanto, prevê punições para delatores que mentirem em seus depoimentos ou que
não apresentem provas que possam corroborar as alegações feitas. As punições
podem variar desde a redução dos benefícios concedidos até mesmo a anulação
das delações.
Em um dos depoimentos prestados por Joesley em sua delação, ele disse ter
aberto duas contas no exterior em seu nome nas quais depositava propinas
referentes a contratos que empresas do grupo J&F mantinham com o BNDES
(Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), intermediados pelo ex ministro da Fazenda Guido Mantega, que nega as acusações.
Ele disse aos procuradores que, segundo Mantega, uma conta seria referente a
acertos feitos durante o governo Lula e a outra durante o governo Dilma. Ainda
segundo Joesley, o empresário repassava extratos das contas para o ex-ministro,
que mostraria os extratos para os ex-presidentes.
O dinheiro depositado nas contas, segundo Joesley, foi depois “descontado” com as
doações para campanhas eleitorais.
Como Lula e Dilma não possuem mais foro privilegiado, a PGR passou a
investigação sobre as alegações feitas pelo empresário para a PR-DF (Procuradoria
da República no Distrito Federal), em primeira instância. Os dois ex-presidentes
negam as acusações feitas por Joesley.
O caso ficou sob responsabilidade do procurador Ivan Cláudio Marx, que já
investiga outros processos envolvendo o ex-presidente Lula. Foi ele quem
denunciou Lula pelas suspeitas de que o ex-presidente tenha cometido o crime
de tráfico de influência para que a Odebrecht conseguisse contratos em Angola.
Também foi ele quem pediu o arquivamento da investigação que apurava a suposta
participação de Lula em um “comitê de crise” formado por senadores para se
contrapor à Operação Lava Jato.
Procurador aponta três incongruências
Para Ivan Marx, a versão contada por Joesley tem pelo menos três pontos de difícil
comprovação. O primeiro é a ligação entre as contas e os ex-presidentes. “Ele diz
que as contas teriam recursos em favor dos ex-presidentes, mas as contas estavam
em nome do próprio Joesley. Era ele quem operava as contas”, afirmou o
procurador.
O segundo ponto seria a falta de evidências de que tanto Lula quanto Dilma sabiam
da existência das contas.
“Primeiro, ele disse que o Guido Mantega havia falado que os dois [Lula e Dilma]
sabiam das contas e viam os extratos. Depois, ele disse que teve conversas tanto
com Lula quanto com Dilma sobre essas contas. Mas, até agora, só temos a
palavra dele”, disse Ivan Marx.
O terceiro ponto é a relação entre o dinheiro que Joesley depositava no exterior e
as doações feitas pela JBS durante as eleições.
“O dinheiro saía do Brasil e ia para essas contas no exterior, mas não voltava ao
país para fazer as doações. Segundo ele mesmo, o dinheiro das doações não saía
dessa conta”, disse o procurador.
Ivan Marx disse que, se ficar comprovado que Joesley mentiu sobre as contas
atribuídas a Lula ou Dilma, caberá à PGR avaliar as eventuais punições no âmbito
das delações premiadas.
Procurada, a J&F, holding que controla a JBS, disse que “nenhum dos
colaboradores mentiu em qualquer depoimento prestado à Procuradoria-Geral da
República e ao Ministério Público Federal”.
Em nota, o grupo disse ainda que, “a despeito do grande número de informações e
provas já entregues, o compartilhamento de provas e informações complementares
entre a PGR e os demais ofícios do MP estão sendo tratados dentro dos trâmites
legais” e que os “colaboradores continuam disponíveis para cooperar com a
Justiça”.
Procurada, a PGR disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que “não vai
comentar a manifestação do procurador” Ivan Marx, que os “colaboradores
precisam entregar documentos que corroborem as afirmações que fazem” e que,
“caso fique comprovado que o colaborador não entregou todas as informações ou
documentos necessários para comprovar as afirmações ou mentiu, o acordo de
colaboração pode ser revisto”.
O que disseram os ex-presidentes?
Em maio, quando as delações foram divulgadas, Cristiano Zanin Martins e Roberto
Teixeira, advogados de Lula, divulgaram uma nota na qual negavam o envolvimento
do ex-presidente nos atos narrados por Joesley.
“Verifica-se nos próprios trechos vazados à imprensa que as afirmações de Joesley
Batista em relação a Lula não decorrem de qualquer contato com o ex-presidente,
mas sim de supostos diálogos com terceiros, que nem sequer foram comprovados”,
dizia um trecho da nota.
A assessoria de Dilma Rousseff, por sua vez, disse, também por meio de nota,
disse que “são improcedentes e inverídicas as afirmações do empresário”. A nota
dizia que Dilma rejeitava “delações sem provas ou indícios”.
Por Leandro Prazeres Do UOL