Manaus – Aos 69 anos, o porteiro Clovis Denizar Melo Ferreira já avisa a quem passa por ele que vai parar de trabalhar aos 70. Mas, por enquanto, o alerta é em tom de brincadeira. Quem o impede de falar sério é o Supremo Tribunal Federal (STF).
Denizar, morador de iranduba, que trabalha em um edifício mercadinho no Centro da cidade, é um dos cerca de 180 mil brasileiros com ação na Justiça pela desaposentação: a possibilidade de o trabalhador, aposentado e que seguiu trabalhando, voltar a se aposentar com um benefício maior, incluindo as contribuições do último período.
– Minha aposentadoria, hoje, não chega bem a R$ 1 mil. Por isso, não posso parar de trabalhar agora. Com a desaposentação, sei que vai para perto de R$ 2 mil. Aí, daria para pensar em parar – projeta o aposentado.
O que o STF decidir valerá para os demais processos em julgamento. A expectativa é de retomada do julgamento neste ano, ainda no primeiro semestre. Dos 11 ministros do STF, quatro votaram e deixaram o placar empatado em 2 a 2. Para quem não entrou na Justiça, a dica é não perder tempo. Não se descarta que o STF aprove a desaposentação apenas para os processos em andamento.
Não é regra
Porém, um cuidado: não é regra a desaposentação dobrar o valor do benefício. Cada caso é diferente, como alerta o advogado especialista em direito previdenciário Paulo André Solano.
– Não se entra com ação de desaposentação sem um cálculo objetivo feito pelo advogado. É isso que vai dizer se o benefício vai aumentar e se vale a pena entrar com a ação – diz Paulo.
Geralmente, quem seguiu contribuindo com um valor parecido com o que era descontado antes da primeira aposentadoria tem a ganhar com a revisão. Mas é apenas um primeiro indício de que o aposentado deve buscar mais informações.
– Lembro de um caso em que a ação resultaria em um aumento de R$ 10 na aposentadoria. Vale a pena mover a máquina judicial e ter custos de processo por esse valor? Por isso, precisa ser avaliada – completa a advogada e presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) Jane Berwanger.
Mas o caminho para a votação no STF tem alguns percalços. O maior deles, a pressão sobre os ministros quanto à repercussão nos cofres públicos. Isso, mesmo com cálculo do IBDP que revela existir viabilidade financeira.
– A tendência é eles segurarem ao máximo esse julgamento. Quando o governo não quer pagar algo, diz que não tem dinheiro. A pressão sobre os ministros será muito forte _ projeta o presidente da Federação dos Trabalhadores Aposentados e Pensionistas do Estado (Fetapergs).
UM GUIA SOBRE O ASSUNTO
O QUE É A DESAPOSENTAÇÃO
– É a possibilidade de o aposentado que continuou trabalhando após sua aposentadoria utilizar as contribuições previdenciárias desse trabalho para um novo cálculo.
– A tese surgiu após 1995, quando a União terminou com o pecúlio, que era a devolução dessas contribuições corrigidas a partir da saída definitiva do trabalho.
– Depois de 1995, as contribuições pós-aposentadoria não voltavam para o trabalhador, o que provocou a elaboração da tese da desaposentação.
O QUE DIZ A LEI
– Até o momento, não existe previsão legal para o tema.
– Houve proposta de lei enviada ao Congresso, mas foi vetada pelo Executivo.
NA JUSTIÇA
– As ações começaram a chegar à Justiça Federal, que, em grande parte dos casos, decidia favoravelmente ao trabalhador.
– Ao subir na esfera da Justiça, o assunto chegou ao Supremo Tribunal de Justiça, que unificou o entendimento favorável a quem solicitava o recálculo.
– Chegou ao Supremo Tribunal Federal uma dessas ações que terá repercussão geral. Ou seja, impactará nos demais processos em julgamento na Justiça brasileira.
– Hoje, a votação da matéria no STF está empatada em 2 a 2. Ainda faltam os votos de sete ministros.
– A expectativa é de retomada do julgamento neste ano, talvez ainda no primeiro semestre.
PARA QUEM VALE A PENA
– A desaposentação não é vantagem para todos aqueles que se aposentaram e continuaram a contribuir.
– Para começar a valer a pena, a contribuição pós-aposentadoria deve ser parecida
com a anterior ou maior.
– Mas, mesmo assim, o aposentado não deve entrar com ação
antes de um cálculo objetivo que apontará o valor do novo benefício com o recálculo.
– O risco é se obter um novo benefício menor do que o anterior ou pouco maior, o que acaba em prejuízo.
– Um advogado deve fazer esse cálculo para o aposentado.
QUANTO GANHA A MAIS
– O aumento da aposentadoria dependerá do tempo e do valor da contribuição.
– É possível que se receba, ao final da ação, um valor acumulado, a diferença desde o momento do ingresso da ação.
– As contribuições feitas após o ingresso na Justiça não podem
ser inseridas no pedido já em andamento.
OS DOCUMENTOS NECESSÁRIOS
– Carta de concessão do benefício
– Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS)
– Cópia integral do processo administrativo que concedeu a aposentadoria.
– CPF, RG e comprovante de residência
– O advogado pode solicitar outros documentos. Ele ainda pode auxiliar na
busca pela documentação.
A QUEM RECORRER
– A ação passa, obrigatoriamente, pelos serviços de um advogado.
– O profissional pode ser particular ou ligado a alguma associação de classe.
– A associação de aposentados da sua categoria tem quadro de advogados para atender a essas demandas.
Defensoria Pública da União
– Para quem não tem condições de pagar pela assistência de um advogado.
– O critério é a renda familiar mensal. Atualmente, o limite de renda para a assistência pela Defensoria Pública da União é de:
– Família até cinco pessoas: três salários mínimos (R$ 2.640)
– Família de seis pessoas ou mais: quatro salários mínimos
(R$ 3.520)
– Onde fica: Rua Comendador Manoel Pereira, 24, Centro, Porto Alegre. Telefone 3216-6946. Atendimento das 9h às 15h.
Fetapergs
– Outro caminho é pela Federação dos Trabalhadores Aposentados e Pensionistas do Estado (Fetapergs). O aposentado só paga ao final da ação, se ganhar.
– Porto Alegre: Rua Siqueira Campos, 1.184, 11º andar, sala 1.109. Telefone 3286-1660. Atendimento de segunda a sexta-feira, das 8h30min às 16h. Advogados atendem pela manhã.
– Interior: a Fetapergs possui 101 entidades filiadas das mais diferentes categorias, em diversas cidades. Confira onde encontrar no site
fetapergs.org.br.