Brasília – Em um ano, 564 deputados federais, entre eleitos e suplentes, utilizaram R$ 3.987.966,95 em serviços postais da chamada cota parlamentar, verba indenizatória concedida pela Câmara dos Deputados –são cerca de R$ 332 mil mensais. As informações são do UOL.
Os parlamentares que mais utilizaram o serviço foram Cristiane Brasil (PTB-RJ), filha do exdeputado Roberto Jefferson, pivô do escândalo do mensalão, Eros Biondini (Pros-MG) e Jair Bolsonaro (PSC-RJ). Eles gastaram o equivalente a 8,41% do total de gastos dos demais deputados, ao mesmo tempo em que o trio representa apenas 0,53% do total que pediu ressarcimento à Câmara pelas despesas.
A média mensal de despesas dos três é de R$ 27.951. Brasil foi a campeã de gastos entre março de 2016 e este mês, com R$ 121.901,27, ainda assim inferior aos R$ 173.702,14 do período imediatamente anterior. Ao contrário dos demais parlamentares, não é possível discriminar em quais serviços foram executados os gastos. Consultada pela reportagem, a assessoria de seu gabinete disse que o registro de notas fiscais é feito pelo sistema da Câmara apenas em casos de reembolso. “Quando o parlamentar faz as postagens com recursos previstos na cota parlamentar, não se registra notas fiscais no site. As notas só estariam lá se o gasto tivesse sido feito com o cartão do próprio parlamentar, por exemplo.
No entanto, nesse caso, os envios de correspondência foram feitos todos dentro da cota parlamentar que é disponibilizada pela própria Câmara para cada parlamentar”, afirmou o gabinete, por meio de nota. Um só deputado enviou mais de 149 mil cartas no ano Eros e Bolsonaro foram os campeões de envio de correspondência. O deputado mineiro, integrante da Renovação Carismática da Igreja Católica e ex-apresentador do programa “Mais Brasil”, da TV Canção Nova, enviou 149.009 cartas no período, além de 233 correspondências registradas. Seu gasto com correspondências foi de R$ 115.636,72.
O pico aconteceu em dezembro, com R$ 76.273,80 dispensados. A época do ano, por coincidir com Natal e AnoNovo, é a campeã de registros de gastos com serviços postais. O parlamentar fluminense enviou uma quantidade menor: 135.940 no período, com gasto total de R$ 97.874,14. “Vão muito mais correspondências do que essas cartas”, afirma Jorge Francisco, chefe de gabinete de Bolsonaro. Segundo ele, os funcionários lotados no Rio de Janeiro selecionam pelo CEP os potenciais eleitores do deputado que receberão a carta, com uma espécie de prestação de contas do deputado, em mãos. “Ele fazia mais [envio de cartas], mas com a informatização faz menos. O ano passado foi atípico, porque ele evita o período eleitoral para não confundir as coisas.” No ano passado, Apu Gomes/Folhapress Bolsonaro lançou dois filhos nas eleições municipais: o deputado estadual Flávio, candidato a prefeito pelo PSC, e Carlos, eleito vereador pelo mesmo partido na capital do Estado. Jorge Francisco, chefe de gabinete de Jair Bolsonaro, sobre o envio de 135.940 cartas pelo mandato do deputado em um ano O chamado “cotão” é criticado por entidades como o Ministério Público Federal e a ONG Contas Abertas.
O MPF investiga suspeita de desvios da cota parlamentar de pelo menos 30 deputados e alguns que já perderam o mandato. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já pediu a revisão do benefício, limitando a cota. Na quinta-feira (23), o UOL publicou reportagem sobre as despesas com refeições dos deputados ressarcidas pela Câmara. Os campeões de gastos nesse quesito foram o deputado federal Zeca Dirceu (PT-RJ) e o atual ministro da Cultura, Roberto Freire (PPS-SP). A cota parlamentar é uma espécie de adendo aos vencimentos do deputado que varia conforme a distância do Estado de origem do Congresso. Esse valor vai de R$ 44.612,53 (Roraima) a R$ 30.788,66 (Distrito Federal).
O salário, de R$ 33.763, permanece intacto enquanto o parlamentar pede o ressarcimento de gastos à Câmara. Ela existe desde 2009, quando a verba indenizatória, que vigorava desde 2001, e as cotas de passagens aéreas e postal-telefônica foram unificadas. Se não utilizado, o saldo mensal da cota parlamentar fica acumulado para os meses seguintes. Despesas com locomoção que envolvam aluguel e fretamento de carros e aeronaves, táxis, pedágios e estacionamentos, combustíveis e segurança são as únicas limitadas.
A cota ainda permite ao deputado usar até R$ 1.747 para complementar o auxílio-moradia de R$ 4.253. “Esses penduricalhos surgiram em um momento em que os parlamentares reclamaram que os salários estavam baixos”, afirma o secretário-geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco. “Essas verbas foram aumentadas de maneira generosa. Depois, os salários foram aumentados, e essas verbas continuaram.
Os parlamentares nunca abriram mão dessa verba, que distorce o equilíbrio das eleições, porque o candidato com mandato tem recursos que o sem mandato não pode usar.” Vão muito mais correspondências do que essas cartas Essas verbas foram aumentadas de maneira generosa. Os parlamentares Castello Branco, da Contas Abertas Cartas para os idosos Dos três campeões do uso dos serviços postais, dois recorrem ao eleitorado idoso para justificar a atitude. “Desde o começo de sua trajetória política, Cristiane Brasil trabalha em prol do aprimoramento de políticas públicas direcionadas à população idosa. É, portanto, com esse público que a deputada se comunica preferencialmente a partir de seu gabinete.
Uma das dificuldades da população acima de 60 anos, no entanto, é a inserção digital. Por conta desse perfil, naturalmente o contato com essa parcela da população precisa ser feito por carta, o que, infelizmente, demanda um gasto maior com serviços postais. A deputada, no entanto, mantém todos os registros fiscais dessas postagens em seus arquivos no gabinete”, afirmou, em nota, a assessoria da deputada Cristiane Brasil. No caso de Bolsonaro, o alvo são os militares reformados, pensionistas das Forças Armadas e herdeiros da classe. “O deputado tem um eleitorado que se relaciona com o gabinete e, por ter uma certa idade, prefere as correspondências para ser informado da prestação de contas do mandato”, diz seu chefe de gabinete.
A assessoria do parlamentar afirma que ele tem um cadastro de mala direta com mais de 140 mil nomes. Eros Biondini diz que a opção pelas correspondências acontece graças ao tamanho de seu eleitorado (foi o oitavo mais votado em Minas Gerais, com 179.073 votos). “Recebi votos em 830 municípios, praticamente todos num Estado com 853 cidades e mais de 15 milhões de eleitores.
Considero esse um meio eficaz para chegar aos meus eleitores, com a prestação de contas de meu mandato, através de boletim informativo. Todos os procedimentos legais são adotados e todas as notas apresentadas foram aprovadas pela Câmara”, afirmou, em nota, o deputado. Para o secretário-geral da ONG Contas Abertas, o uso é de correspondência como canal de comunicação com o eleitor é ineficaz e antiquado. “É absolutamente desnecessário mandar nunca abriram mão dessa verba, que distorce o equilíbrio das eleições, porque o candidato com mandato tem recursos que o sem mandato não pode usar correspondências em aniversários, Dia da Mulher, Natal, Ano-Novo.
Mas é um mecanismo que surte algum efeito, porque o eleitor fica grato. Não imagina que quem faz aquilo não é o próprio deputado, mas um sistema de mala direta”, diz Gil Castello Branco. “Vamos levar algum tempo para chegar à conclusão de que esse Congresso é caro, ainda mais em uma época em que a sociedade não se vê representada por ele.” Procurada, a Câmara respondeu, também por meio de nota, que medidas estão sendo adotadas para aprimorar os procedimentos de controle e utilização da cota, “entre as quais se incluem iniciativas que facilitam a fiscalização dos gastos parlamentares pela sociedade e pelos órgãos de fiscalização externa”. Uma das medidas foi a determinação da obrigatoriedade de digitalização das imagens dos comprovantes de despesa, que passaram a ser publicadas na área de transparência do portal da instituição.