MANAUS (AM) – Uma estudante do 8º período do curso de medicina da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), de apenas 24 anos, tirou a própria vida na última quarta-feira (25), no bairro Cachoeirinha, Zona Sul de Manaus. O fato comoveu a comunidade acadêmica e acendeu o alerta sobre a saúde mental dos universitários, que cobram políticas públicas para evitar mais casos como esse.
Vinda do interior do Amazonas, de Humaitá, a jovem estaria sofrendo com a pressão do curso, o mais concorrido. Sendo integral, com rotina desgastante e ainda lidando com a diferença social entre os colegas, a estudante não foi a única.
Segundo colegas de curso ouvidos pelo Expresso AM, os pais da universitária moravam no interior e recentemente um professor teria a humilhado após a correção de uma prova. “Ela não estava se achando boa o suficiente e estava ‘desperiodizada’. Não dá para dizer que foi por causa disso, mas o professor falou um monte de coisa para ela”, disse uma colega, citando que a jovem estava com dificuldade em ser aceita nos grupos por causa das notas. Ela também não conseguiria ir ao internato nesse momento.
O curso exige tanto a saúde mental quanto física e pode desencadear problemas como depressão, ansiedade e dependência em álcool e outras drogas, segundo dados do Conselho Regional de Medicina de São Paulo. Só para se ter ideia, a taxa de suicídio entre médicos na região sudeste é de 70% maior que na população em geral.
Trazendo a discussão para o gênero, o sexo feminino, um estudo publicado pela revista Acta Psychiatrica Scandinavica aponta que ser mulher e estudar medicina aumenta o risco de suicídio.
Em um universo de 4.840 estudantes de medicina de todo o Brasil, os resultados indicam que, do total, 9% deles já havia tentado tirar a própria vida – 7% das mulheres diante de 2% dos homens.
São vários os motivos para se desencadear a vontade de tirar a própria vida, mas o mesmo estudo aponta que o ambiente acadêmico colabora – e muito – para o alto índice. A maior cobrança por serem mulheres e o sentimento de competitividade é grande.
Nesse ponto, colegas de curso e de outros da UEA ressaltaram a pressão psicológica e professores abusivos que colaboram com o problema. “Precisamos estar saudáveis psicologicamente, emocionalmente e fisicamente, mas o curso nos desgasta em todas essas áreas (…) Quem vive de medicina de Instagram de estudos com fotos bonitinhas, jamais saberá o que é de verdade a universidade que te trata sendo somente ‘universitário’, como se não tivesse uma vida, uma família, um emprego, um filho, e tantas outras situações depois do portão da faculdade”, escreveu a acadêmica Gabriela Ferreira, em post da UEA, nas redes sociais.
Como já registrado em outros anos, a unidade de saúde do curso e também de outras teve universitários que não conseguiram lidar com o que sentiam. “Não é o primeiro caso e talvez não seja o último. Impossível esquecer do caso do meu amigo. Cometeu suicídio após uma aula, de manhã. A UEA não se importa com a saúde mental dos seus alunos. Não tem política de acolhimento aos acadêmicos”, disse também Rafael Moreira.
Sinais e comportamentos
Mas o que pode ser feito para mudar esse cenário? Antes de tudo, alguns sinais e comportamentos podem indicar se a pessoa está em uma situação limite, como os sintomas depressivos ou mudanças abruptas de comportamento, indicam os especialistas.
A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) informa que é necessário trazer o assunto do suicídio cada vez mais e que dizer que não se deve debater o tema, que poderia induzir ao outro a tirar a própria vida, é um mito.
É importante falar sobre o assunto com a finalidade de educar, prevenir e orientar a população. A educação e a desmistificação do tema são fundamentais para diminuir esse fenômeno.
As iniciativas educacionais dentro das universidades também podem ajudar a identificar os alunos em situação de maior vulnerabilidade.
Em nota, a UEA informa que possui o Espaço de Atendimento Psicossocial da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (Epsico/Proex). O local, inaugurado em 2018, atua na promoção da saúde mental e psicossocial da comunidade acadêmica da universidade.
Ainda segundo a universidade, a mesma está aberta ao diálogo com os alunos. “Destaca-se, ainda, que em nenhum momento houve registro formal na direção da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESA) sobre abuso psicológico e enfatiza que está aberta ao diálogo e para atender os discentes sobre qualquer assunto pertinente à comunidade”, diz trecho da nota.
Leia na íntegra:
“A Universidade do Estado do Amazonas (UEA) informa que possui o Espaço de Atendimento Psicossocial da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários (Epsico/Proex). O local, inaugurado em 2018, atua na promoção da saúde mental e psicossocial da comunidade acadêmica da universidade.
Destaca-se, ainda, que em nenhum momento houve registro formal na direção da Escola Superior de Ciências da Saúde (ESA) sobre abuso psicológico e enfatiza que está aberta ao diálogo e para atender os discentes sobre qualquer assunto pertinente à comunidade.
O agendamento de atendimentos individuais da comunidade acadêmica da UEA é realizado por meio de um formulário disponível no site do Epsico e pelo telefone 92 98417-9196. O Epsico está localizado no 1º andar da ESA, situado na avenida Codajás, 25, Cachoeirinha.
A UEA reitera, ainda, que a gestão do reitor André Zogahib está empenhada em ampliar os recursos humanos e a capacidade de atendimento para expandir o acompanhamento da demanda existente. Diante disso, está organizando a comissão que desenvolverá a Política de Saúde Mental e Atenção Psicossocial (PMAP) da UEA.”
O CVV – Centro de Valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo por telefone, e-mail e chat 24 horas, todos os dias. O site é o https://www.cvv.org.br/.
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