Brasília – Uma reunião na quarta-feira, no Palácio do Planalto, uniu três Poderes da República em torno de uma proposta que pode resolver dois problemas da elite política de uma só vez: reduzir a previsível renovação do Congresso no ano que vem, quando os eleitores vão às urnas para votar em deputados e senadores — além de presidente e governadores —, e evitar que muitos, entre os cerca de 100 parlamentares que podem se tornar réus na Lava Jato, percam o foro privilegiado e tenham seus processos enviados para a primeira instância, sob os cuidados de juízes como Sérgio Moro.
A proposta retirada da cartola é a do chamado ‘voto em lista fechada’. Funciona assim: atualmente, o eleitor escolhe em que candidato quer votar, dentro das listas de candidatos apresentadas pelos partidos. A proposta que está em discussão e tem a aprovação dos presidentes da Câmara, do Senado e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassa o direito do eleitor escolher em quem votar. Ele escolherá apenas o partido. Ficará para as direções partidárias definir, por antecedência, a ordem dos candidatos na lista. “Era o que faltava! Os mesmos políticos ficarão lá”, diz o vendedor Francisco Gaspar, de 69 anos, que ameaça anular o voto se a proposta vingar.
A lista fechada é adotada em alguns países e tem a virtude de fortalecer os partidos, o que, dentro de um quadro de normalidade democrática, é positivo. Porém, no momento em que a ‘lista de Janot’ está prestes a ser divulgada, trazer a proposta à tona causou estranheza. O próprio Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, votou contra um projeto nesse sentido em 2015.
“É uma proposta que favorece a continuidade de quem domina as máquinas partidárias”, diz o cientista político Malco Camargos, da PUC-MG. “No momento, a ideia da proposta, claro, é garantir o foro privilegiado para os atuais deputados”.
Atuais deputados no alto da lista
Para que o plano traçado no jantar com Temer se consolide, os líderes aticulam a aprovação de uma reforma eleitoral até setembro de 2018. A intenção é estabelecer uma regra pela qual a lista dos partidos seja encabeçada pelos atuais deputados. O presidente do Senado, Eunício Oliveira, já deu a senha nesse sentido. “Defendo um modelo de transição, mas defendo lista preordenada”, disse, após a reunião.
Eunício, assim como Maia, são presenças garantidas na ‘lista de Janot’. Segundo um delator da Odrebrecht, Eunício recebeu R$ 2,1 milhões via Caixa 2 da empresa; Maia, R$ 600 mil.
Nas pesquisas que medem a credibilidade das instituições, os partidos políticos ocupam invariavelmente a lanterna. Portanto, não é de se estranhar que a rejeição à proposta de voto em lista fechada seja praticamente unânime nas ruas. “A gente já é obrigado a votar, agora vai ter que votar no partido?Atualmente, eu não consigo diferenciar a ideologia dos partidos. Não sei o que é o PT, PSDB, PMDB”, diz o cabeleireiro Fábio Carvalho, de 34 anos.
O problema é que a opinião pública não parece tão importante para os parlamentares nesse momento. “Mudou muito em relação a quatro anos atrás. Atualmente, a preocupação não é com o eleitor, é com a própria sobrevivência. O importante é tentar, de alguma forma, se livrar de sofrer alguma pena”, diz o cientista político Malco Camargos.
“Essa proposta é fundamental para que eles garantam a mantuenção do foro privilegiado”, diz Alesandro Molon (Rede-RJ). “Eles nunca foram a favor. Mudaram de ideia, de repente?”,questiona. “Pegar esse Congresso e engessar? Isso é uma ideia completamente inaceitável”, diz o parlamentar, que é membro da comissão da Câmara que estuda mudanças no sistema eleitoral. O relator da comissão, o petista Vicente Cândido (SP), é outro defensor do voto em lista fechada. O argumento dele é o encarecimento das campanhas no sitema atual.
Mais dinheiro público nas campanhas
Outra das propostas de mudança nas regras eleitorais em estudo diz respeito ao financiamento das campanhas eleitorais. Com a proibição do financiamento de empresas, o gasto das campanhas eleitorais no ano passado despencou 71%, quando comparado a 2012, segundo levantamento divulgado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O custo das campanhas para vereador e prefeito no primeiro turno caiu de R$ 7,7 bilhões em 2012 para R$ 2,2 bilhões em 2016.
Os grandes partidos avaliam que terão grandes dificuldades na captação de recursos no próximo ano, sobretudo com os desdobramentos da Lava Jato. A solução defendida por parlamentares como o senador Romero Jucá é elevar o montante de recursos públicos destinados aos partidos, com a criação de um fundo único, com recursos públicos e de doadores privados, que seria distribuído sem a interferência do doador.
Alessandro Molon (Rede-RJ) é contra. “O TSE poderia disponibilizar uma plataforma de financiamento para auxiliar a que cada eleitor ajude a financiar os candidatos de sua escolha”. Com informações O DIA.