Manaus – A Prefeitura de Manaus firmou, na gestão do prefeito Artur Neto (PSDB), pelo menos quatro contratos com empresários presos pela Operação Maus Caminhos, que investiga desvios de recursos públicos na área da saúde. Um dos contratos, de 1,12 milhão para controle do vetor do Zika vírus, foi estabelecido sem licitação.
A denúncia foi apresentada em rede aberta de televisão, durante o primeiro debate do segundo turno das eleições municipais, na noite de sexta-feira. O adversário de Artur na disputa, Marcelo Ramos (PR), questionou o prefeito sobre o caso e avisou que colocaria os extratos dos contratos em sua página do Facebook. “Se isso é verdade, o Homero está demitido. Não sou o Melo, que simplesmente coexiste com a corrupção”, disse Artur na ocasião, referindo-se a Homero de Miranda Leão, secretário municipal de Saúde.
Na manhã de sábado, confrontado com os documentos, o prefeito informou que não se pronunciaria sobre a ameaça de demissão. A única manifestação da Prefeitura sobre os acordos com os empresários presos veio do próprio secretário ameaçado de perder o cargo. Homero negou irregularidades nas contratações e anunciou que processará Marcelo Ramos por calúnia.
Vacina cara
O primeiro contrato da gestão Artur com empresários envolvidos na Maus Caminhos é o 029/2014, firmado com a empresa Silvio Correia Tapajós e Cia Ltda para a realização da campanha de vacinação antirrábica de 2014. A SCT pertence a Gilberto de Souza Aguiar, um dos 19 presos pela Polícia Federal acusados de operar esquema de desvio de verbas da Saúde.
Em 2014, a Prefeitura de Manaus pagou mais de R$ 1,7 milhão pelo serviço da SCT. No ano anterior, os mesmos 33 dias da campanha de vacinação custaram R$ 895 mil aos cofres públicos. Das planilhas dos dois pregões publicadas na internet, deduz-se que o aumento veio do reajuste no valor da diária paga aos vacinadores, que saiu de R$ 108,50 para R$ 211,03.
Segundo o secretário de Saúde, a diferença de valor dos contratos se deu em razão de “serviços adicionais incluindo despesas que não constavam no contrato de 2013”. Ele lembrou que os dois contratos foram “devidamente licitados” e acrescentou que, nos anos seguintes, em vez de terceirizar a vacinação, a própria secretaria cuidou da campanha, gerando economia de R$ 1,7 milhão aos cofres públicos
Desdobramentos
Deflagrada no dia 20 de setembro pelo Ministério da Transparência, pela Controladoria-Geral da União, pela Polícia Federal, Ministério Público Federal e a Receita Federal, a Maus Caminhos levou 19 pessoas para a cadeia.
Foram apontadas fraudes em contratos do Governo do Estado com o Instituto Novos Caminhos (INC). Em dois anos, a entidade recebeu mais de R$ 276 milhões para administrar duas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), em Manaus e Tabatinga, e um centro de reabilitação para dependentes químicos, no município de Rio Preto da Eva.
Em entrevista coletiva no dia da Operação, as autoridades afirmaram que não havia, até aquele momento, agentes públicos investigados. Ressaltaram, porém, que a partir das prisões e apreensão de documentos, novos “braços” da organização criminosas deveriam ser descobertos.
Apontado como chefe do esquema, o médico Mouhamad Moustafa conseguiu na semana passada transferência para o Comando de Policiamento Especializado (CPE) da Polícia Militar. A PF apontou que o patrimônio dele aumentou 35 vezes em quatro anos e chegou a R$ 14.111.779,72 em 2015. O dinheiro era usado para adquirir bens de alto padrão, como avião a jato, veículos importados e imóveis caros.
Contrato milionário com dispensa de licitação
A Secretaria Municipal de Saúde (Semsa) já havia firmado outros três contratos com a empresa D de Azevedo Flores – ME, cujo sócio é Davi de Azevedo Flores, que também foi preso pela operação Maus Caminhos em setembro. Estes contratos, firmados entre 2015 e 2016, somados, representam um repasse de R$ 3,1 milhões à empresa. O contrato mais recente, de nº 030/ 2016, foi celebrado em julho com dispensa de licitação, no valor de R$ 1.193.821,44. A empresa foi contratada para fazer o controle vetorial do mosquito Aedes aegypti.
Os contratos 023/2015 e o 030/2016, foram rescindidos na época em que a operação estourou, conforme consta no Diário Oficial do Muncípio (DOM) do dia 23 de setembro.
Na ocasião, a Semsa afirmou, em nota, que todos os contratos da secretaria eram feitos observando as exigências legais e que os firmados entre ela e Davi de Azevedo Flores eram regulares, mas que optava pela rescisão contratual como medida de precaução.
“Com o afastamento do proprietário da empresa pela operação Maus Caminhos, da Polícia Federal, criou-se uma insegurança administrativa quanto à continuidade dos serviços, considerados essenciais”, lia-se no documento.
O outro contrato com a empresa, o 010/2016, firmado em fevereiro deste ano, tinha prazo de três meses e 19 dias, já tendo sido concluído quando a operação da PF foi deflagrada.
Em aberto
Questionado sobre as denúncias feitas por Marcelo Ramos na noite de sexta-feira, o procurador-geral do Estado, Fábio Monteiro, informou por meio da assessoria que não se pronunciaria sobre questões da área da Saúde pois já há diversas investigações abertas no MPE. Em entrevista a A CRÍTICA publicada no domingo passado, dia 09, o procurador-geral disse que novas irregularidades podem vir à tona nos próximos meses: “Tem inquéritos apurando diversos contratos, tanto do Estado quanto da Prefeitura. Não tenha dúvida que haverá desdobramentos. Esse é o objetivo”.